Já aqui fiz referência a este genocídio há um ano. Volto a ele até porque se deu essencialmente em 1966.
A passagem de 50 anos sobre o
massacre da Indonésia, superior duas a quatro vezes em número de mortes às de
Hiroshima e Nagasaki, que se traduziu no assassinato de entre 500 mil e um milhão
de comunistas, é um bom momento para pensar até onde podem ir os desígnios de
uma política realizada por seres “humanos”.
O Partido Comunista da Indonésia
era então o maior partido comunista da Ásia, depois do Chinês, e apoiava o
governo liderado pelo presidente Sucarno, um dos mais destacados dirigentes do
Movimento dos Não Alinhados.
Depois de uma provocação que
custou a vida a oficiais-generais, mas em que Suharto “conseguiu” não ser um
deles, este assumiu a direcção do golpe como seu principal responsável, que levou aos
assassinatos em massa.
A revista Time em 15 de Julho de 1966 (P. 22-26) caracterizou o genocídio como
"a melhor notícia da Ásia para o Ocidente durante anos", relatando despreocupadamente as
mortes em Java Oriental, onde
“os chefes "comunistas suspeitos" foram decapitados e empalados
defronte das suas casas para as viúvas e os filhos verem”. Antes
disso, em 19 de Junho, o título da coluna de James Reston, no New York Times, era “Raio de luz na
Ásia”.
Tendo assumido o controlo da
situação, Suharto declarou o Partido Comunista da Indonésia (PKI) como o
dalang, ou "mestre de marionetes" por trás do assassinato dos
generais, acusação que nunca foi sustentada em factos. Os anos seguintes viram
não só a destruição do Partido Comunista mas também a morte de centenas de
milhares de comunistas indonésios. Entre 1965 e 1966, uma série de assassinatos
em massa ocorreram em todo o arquipélago, especialmente na Java Central e
Oriental, Bali, e no Norte de Sumatra (1). Na Java Central e Oriental, onde
alguns dos piores massacres aconteceram, a maioria das mortes foi feito por
unidades do exército, em particular a unidade RPKAD, de comandos para-quedistas,
juntamente com vigilantes civis associados em grupos anti-comunistas. Um deles
era o Ansor, movimento juvenil da organização política muçulmana Nahdlatul
Ulama (NU). Em geral, os militares tiveram um papel significativo no fornecimento
de armas, treino e incentivo aos vigilantes em várias regiões do país. Os
assassinatos em si mesmos, muitas vezes tiveram lugar ", quando unidades
do exército anti-comunistas chegavam a uma região."
Não menos importante foi o papel
desempenhado pelos Estados Unidos, juntamente com a Grã-Bretanha, que visavam
destruir o comunismo indonésio com este crime. O Embaixador inglês,
Andrew Gilchrist chamou "propaganda" e “guerra psicológica" ao
genocídio. Os Estados Unidos ajudaram as forças de Suharto através do envolvimento
direto da CIA, a estreita cooperação da Embaixada dos EUA e do Departamento de
Estado, e a orientação do Conselho de Segurança Nacional da administração
Johnson. Num memorando de Novembro de 1965, a CIA sugeriu que os Estados Unidos
não deviam ser" demasiado hesitantes "quanto" à assistência desde
que possamos fazê-la secretamente. "Assim, quando os generais indonésios
pediram aos Estados Unidos armas necessárias" para armar muçulmanos e
jovens nacionalistas na Java Central para uso contra o PKI, "os Estados
Unidos rapidamente concordaram em dar ajuda secreta", sob a designação de
"medicamentos" para evitar revelações embaraçosas "( 4 ). Talvez
Bradley Simpson tenha resumido isto bem nestes termos:" A resposta dos EUA
ao assassinato em massa na Indonésia foi de entusiasmo " - e nós estamos a
falar dos mesmos acontecimento que a própria CIA referia como “um dos piores
assassinatos em massa do século XX”( 5). Foi esta a CIA que quase fez desaparecer os testemunhos fotográficos e em filme.
As
atrocidades não pararam aqui. Na década seguinte, mais de
um milhão e meio de comunistas foram capturados, torturados e aprisionados, a
maioria deles sem julgamento, "por serem comunistas." E para aqueles
que escaparam da morte em prisões, as suas vidas ficaram extremamente difíceis.
Eles foram continuamente sujeitos a discriminação,
tanto pelo Estado como pela sociedade tornada comunistofóbica.
Remato, referindo que Suharto, depois disto e de crimes
posteriores no seu país e em Timor-Leste morreu…na cama. E que nenhum
presidente ou administração norte-americanos pediram desculpas aos familiares
que restaram das vítimas nem pediram desculpas ao mundo.
(1) Mortimer,Indonesian
Communism Under Sukarno,41–42, 366.
(2) Robert
Cribb, “Introduction: Problems in the Historiography of the Killings in Indonesia”,
em edição de Robert Cribb; “The
Indonesian Killings, 1965–1966”,Clayton, Australia: Centre of Southeast Asian Studies,
Monash University, 1990, 3, 12.
(3) Bradley
Simpson, “International Dimensions of the 1965–68 Violence in Indonesia,”
edição de Douglas Kammen and Katherine McGreggor;”The Contours of Mass Violence
in Indonesia”, Honolulu: University of Hawai’s Press, 2012, 58, 62–63; “Notes from the Editors,”Monthly Review 67, no. 5 (October 2015): c2;
Kolko,Confronting the Third World, 181.
(4)
Simpson,
“International Dimensions of the 1965–68 Violence in Indonesia,” 62; A citação da
CIA é feita por Jonah Weiner, “The Weird Genius of ‘The Act of
Killing,’”New Yorker, July 15,
2013. http://newyorker.com
50 anos de um genocídio. E aqui bem perto, há precisamente 80 anos, dava-se a "matanza de Badajoz" que se iniciou com a queda da cidade em 14 de Agosto de 1936 e se prolongou pelos dias seguintes...
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