As etiquetas comerciais estão
a tornar-se num factor de tensão entre alguns países da UE e os EUA a propósito
das negociações do TTIP.
O Le Monde do passado dia 9
dava conta de que a indústria agroalimentar e a grande distribuição se opõem ao
projecto, resultante de um estudo encomendado pelo governo francês, de colocar
um logotipo colorido nos alimentos em função da sua qualidade nutricional. Não
só agora mas nos últimos anos têm-se sucedido os trabalhos científicos que
mostram a eficácia deste tipo de etiquetas na informação aos consumidores para
reduzir os riscos sanitários. Esta questão também vai exigir a clarificação do
governo francês já que uma parte dos peritos mandatados pelo Ministério da Saúde
mantém ligações, nem sempre declaradas, com a indústria.
As cinco doenças mais comuns em muitos países estão
ligadas, no todo ou em parte, à produção e ao consumo de alimentos provenientes
da cadeia agroalimentar industrial: diabetes, hipertensão, obesidade, cancro e
doenças cardiovasculares.. Isto não só se traduz em má qualidade de vida e tragédias
pessoais, mas também em altos gastos com consultas médicas e com o orçamento de
saúde pública, e num enorme subsídio oculto para as multinacionais que dominam
a cadeia agroalimentar, das sementes ao processamento de alimentos e à venda em
supermercados. Fortes são pois as razões para questionar esse modelo de
produção e consumo de alimentos. E fortes são também as razões para a
etiquetagem desses produtos confira segurança aos cidadãos.
Quer neste caso de França quer
no das negociações entre a UE e os EUA sobre o TTIP, também na etiquetagem
destes e outros tipos de produtos, conhecem-se genericamente os tipos de
questões a ser tratadas mas não as opções concretas. E são estas que os
cidadãos reclamam conhecer. Os relatórios são um “faz de conta” e escondem o
que, no concreto, está a ser acordado. Uma entre centenas de perguntas a
esclarecer: como vai a UE reagir ou a que acordou chegou sobre a oposição dos
EUA à referência nas etiquetas a “produto geneticamente modificado”?
Em relação ao TTIP, esta questão da
etiquetagem e da segurança, coloca-se não só no sector agroalimentar mas no
vestuário/têxtil e em em todas as áreas
Fazer o exercício de ler os
relatórios das 13 reuniões já realizadas entre os EUA e a EU mostra isto à
evidência e quem negoceia nas costas dos cidadãos não pode considerar.
Os grupos económicos apelam à simplificação e harmonização das normas de
etiquetagem relativas a peças de vestuário vendidas na União Europeia e Estados
Unidos da América, como forma de impulsionar o comércio inter-regional, reduzir
o número de requisitos de etiquetagem obrigatórios e permitir que as etiquetas
dos produtos sejam o mais simples possível. Isto é “esconder mais para vender
melhor”.
Entre os grupos norte-americanos estão a Aliança Europeia de Marcas de
Vestuário (EBCA), a Associação de Vestuário e Calçado Americana (AAFA) e a
Associação Indústria da Moda dos Estados Unidos (USFIA). Todos eles destacam
que as práticas empresariais modernas requerem a capacidade de transferência de
produtos entre as regiões, como ditam as condições de mercado. Afirmam que “Se
um produto não se vende bem na Europa, deveria ser possível transferir esse
produto para os EUA e vice-versa, assegurando que o produto encontra a melhor
mercado. O produto, portanto, deve estar pronto a ser vendido em qualquer
jurisdição, incluindo no que diz respeito à etiquetagem e línguas”, referem. Em
última análise, pretendem que o TTIP “permita a eficiência do comércio
inter-regional, simplificando os
requisitos de etiquetagem e idiomas, reduzindo assim o comprimento das
etiquetas, resíduos, custos e confusão do consumidor, resultante de quantidades
excessivas de informação. Chegam mesmo ao ponto de, como a
Ginetex-Associação Internacional para a Etiquetagem, dizerem que alguma
etiquetagem e a contemplação nela de direitos de propriedade intelectual se
acabam por reflectir nos preços ao consumidor. E portanto, “cortem nas
etiquetas”…
Harmonização, redução das palavras a símbolos, necessidade de reduzir o
número e línguas usadas pela EU e o excesso de informação. Tudo são
facilidades.
Por detrás de tão bons corações, está a cupidez do aumento dos lucros de
quem quer ver alargados os seus mercados e amortizados mais rapidamente os
investimentos realizados na exportação/produção, procurando, assim, que “o gato
passe por lebre”.
No tocante à
indicação do país de origem de produtos que são importados, neste momento a
Comunidade Europeia não dispõe de legislação sobre a etiquetagem de origem de
produtos industriais importados de países terceiros ("made in").
No decurso da
consulta que a Comissão organizou em 2004, certos estados-membros e vários
organismos interessados (indústrias, sindicatos, consumidores e outras
instituições) tinham expresso a sua preocupação crescente com o aumento da incidência
de etiquetas de origens enganosas e/ou fraudulentas apostas em produtos
importados e tinham requerido o estabelecimento de regras que impusessem a
etiquetagem de origem das importações e/ou dos produtos UE. A proposta que a
Comissão apresentou em 2005 permitia conceber a determinação, pelo menos
parcial, da origem de um produto em função de regras aduaneiras.
No triénio
2009-2011, os eurodeputados comunistas defenderam o conhecimento, tão completo quanto
possível e justificável, da composição dos géneros alimentícios, que constitui
um direito fundamental dos consumidores. Consideraram que deve também existir
informação sobre aditivos alimentares com efeitos alergénicos e a
obrigatoriedade de indicação de origem em determinados produtos, tendo
condenado a inexistência de obrigatoriedade de informação relativa à presença
de organismos geneticamente modificados (OGM) nos alimentos.
Em Portugal, em
8/2/2011, a Comissão Parlamentar de Assuntos Económicos elaborou um parecer
que, face à disposição da Comissão Europeia alterar alguns requisitos da
etiquetagem, não deveria antes de se concluir tal processo, ser revogado o
Regulamento nº1548/98 de definia os requisitos em vigôr à altura.
Em Março deste ano, um grupo de produtores de leite do Norte do
país juntou-se num hipermercado da Póvoa de Varzim para comprar mil litros de
leite nacional e colocar etiquetas em produtos lácteos importados, para
alertar para as dificuldades que o setor atravessa e sensibilizar as
superfícies comerciais e os consumidores a comprarem produtos lácteos
produzidos no nosso país.
Também nesse mês, a CNA referia
que tem de haver coragem
para enfrentar a grande distribuição, que continua a acumular lucros, mesmo
quando aqueles que produzem para ela só acumulem prejuízos. Tem de haver
exigência na rotulagem da produção nacional à qual a grande distribuição tem
resistido. Tem de se verificar se não há dumping na importação de carne e leite
que fazem baixar os preços pagos em Portugal. Exige-se também por parte da ASAE
uma maior atenção através de uma ação forte, visível e dissuasora.
É de esperar que, também em Portugal, os
grandes grupos económicos e as grandes distribuidoras assumam atitudes
semelhantes ao que está a acontecer em França.
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