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quarta-feira, 29 de junho de 2016

Quo vadis, United States of America?


Quando há quinze dias, a presidente da Reserva Federal norte-americana (Fed), Janet Yellen, depois de ter reunido com o Comité Federal do Mercado Aberto (FOMC), fez o anúncio de que a taxa de juros de referência se mantinha entre os 0,25 e os 0,50%, confirmou-se que a recuperação em pleno da economia norte-americana tinha falhado, contrariando anterior anúncio de Obama. Isso foi acompanhado por previsões de crescimento económico que em Dezembro apontavam para entre os 2,3 e os 2,5% no crescimento do PIB, já em Março deste ano, a previsão já era entre os 2,1 e 2,3%, e, recentemente, esse valor desceu para entre 1,9 e 2,0%.

No primeiro trimestre deste ano, a taxa de crescimento do PIB da economia dos EUA foi apenas 0,80%. A recuperação do mercado de trabalho, entretanto, permaneceu muito frágil, apesar de que é suposto ser o principal sucesso das políticas implementadas pelo Fed. Lembre-se que em Dezembro, quando o Fed elevou 25 pontos base a sua taxa de juro de referência, a taxa de desemprego oficial foi de 4,7%, valor que alguns membros do FOMC, consideraram ser uma situação de "pleno emprego". Mas o Fed estava errado. Os dados mais recentes não deixam dúvidas: os ventos de alerta de recessão ameaçam aquela que já foi a maior economia mundial. Em Maio passado, o sector não-agrícola aumentou apenas em 38 mil postos de trabalho, o menor aumento desde 2010. Além disso, os dados de Março e Abril foram revistos em baixa, os empregadores contrataram 59.000 pessoas menos do que o esperado.

A taxa de desemprego caiu para 4,7%, mas a taxa de actividade diminuiu para 62,6% com os milhares de pessoas -se à procura de um trabalho tendo em conta a falta de oportunidades. A realidade é que a taxa de desemprego oficial esconde um enorme subemprego. Tendo em conta as pessoas que tinham empregos a tempo parcial e aqueles que recentemente deixaram de constituir força de trabalho, a taxa de desemprego estaria em 9,7%, mais que o dobro da taxa oficial de desemprego.

A economia norte-americana sofre de um anémico investimento empresarial, em resultado de uma escassa taxa de retorno desse capital que não gera a criação de novas empresas e de importante criação de empregos, sendo que muitos empresários não elevam os salários com as consequências imediatas no dificultar o aumento da inflação – o índice de preços ao consumidor aumentou apenas em 1.1%.

Por outro lado, a instituição responsável pela supervisão da competitividade a nível mundial assinalou que a economia americana sofrerá este ano a primeira contração no seu nível de produtividade ao longo dos últimos trinta anos. A imagem de uma economia dinâmica está em contínuo recuo. Na ausência de inovação, a produtividade dos EUA cairá este ano em 0,2%.

A questão é em quanto os EUA poderiam aumentar a sua dívida para tirar a economia da próxima recessão. A experiência de crises passadas gerou uma grande discordância entre os economistas sobre estas respostas.

Embora a dívida do governo — que avançou para 74% do produto interno bruto, face aos 39% em 2008 — seja alta para os padrões históricos, o déficite orçamental recuou para 2,4% do PIB, o que dá ao país um pouco mais de margem de manobra fiscal. Mas, mesmo que a economia cresça a um ritmo constante, o déficite deve ultrapassar os 3% do PIB no fim da década, aumentando ainda mais a dívida.

“Se houver outra recessão, haverá pressão para aumentar a dívida rapidamente, para um nível sem precedentes nos tempos modernos”, escreveu Stephen King, economista sénior do HSBC, num relatório recente.

A tentativa de atribuir as dificuldades à redução da taxa de crescimento chinesa não resulta. A economia chinesa aguentou à sua custa com os males da economia mundial decorrentes da crise do sub-prime gerada nos EUA. Consequências negativas doBrexit para a economia dos EUA são algo que qualquer país da UE poderá prever para si próprio. Entretanto, os EUA querem vencer as dificuldades impondo aos países europeus e outros um TTIP que corresponde aos interesses dos EUA, que seria um novo passo na globalização económica enquadrada por instituições supranacionais não controladas pelos povos, contrário a regras que são adoptadas na UE de protecção da qualidade e do ambiente e que liquidaria as soberanias.

Se as dificuldades persistirem, os EUA poderão lançar-se numa nova guerra, maior do que aquela em que estão já envolvidos. As manobras da NATO nos próximos dias 8 e 9 na Polónia, numa lógica de confronto com a Rússia são preocupantes.

A realidade económica dramática dos EUA vai prevalecer face a todos os disfarces. Mas os EUA terão que passar a saber relacionar-se de outra maneira com os outros países, praticar a cooperação mesmo no quadro das economias capitalistas. Abandonar a lógica do Império, ainda mais quando as debilidades exigiriam uma maior prudência.

 

terça-feira, 28 de junho de 2016

União Europeia: por aí já não vamos!



1.       O Conselho Europeu está hoje e amanhã reunido, depois da Alemanha, França e Itália terem entre si acertado posições.

Entre comentadores e fabricantes de manchetes o que vai estar em causa é puxar as orelhas à Grã-Bretanha, impondo-lhe a atitude imediata de aplicar o Art.º 50 do Tratado de Lisboa, isto é que ela inicie o processo de saída declarando que o quer fazer de acordo com o recente Brexit, para conter leviandades de outros estados da UE seguirem o mesmo caminho. Conduzir este processo muito rápido e com espírito de retaliação seria a pior maneira. Importa ter presente que o Tratado de Lisboa é uma imposição antidemocrática das elites dirigentes da UE para responder à rejeição popular da Constituição Europeia, federalista, nos anos 2004-2007.

2.      O Brexit vai precipitar o fim da UE ou o que resta dela será capaz de aprender e reverter o caminho que conduziu a este falhanço? Não tenho elementos para ser categórico quanto à primeira hipótese mas tenho fundadas desconfianças na capacidade dos dirigentes europeus serem capazes de concretizar a segunda.

3.      Aconteça o que acontecer importa que, para já o Brexit permita elaborar acordos de saída da Grã-Bretanha mas também acautelar os interesses dos restantes estados-membros, incluindo de Portugal e dos portugueses. Poderá ser provável que a partir do Brexit se precipite o fim da UE, mas importa acima de tudo, para já, libertar-nos da moeda única e do Tratado Orçamental que são tão limitadoras da nossa soberania. E procurar acordos bilaterais do nosso país com países exteriores à EU, não esgotando no espaço “europeu”, que poderá estar em mudança radical, as hipóteses de desenvolver o comércio e actividades em que Portugal tem créditos firmados.

4.      Impactos sobre o futuro da NATO não são de excluir, atendendo a que, cada vez mais, UE e NATO eram já duas faces da mesma moeda, aliás em concordância com as orientações norte-americanas iniciais, depois do plano Marshall, que visavam criar um músculo militar e económico para conter a “expansão soviética na Europa”, depois de terminada a guerra.

5.      Os europeus que, depois da 2ª Guerra, se tornaram conhecidos como os iniciadores do “projecto europeu”, definiram-no em torno de valores civilizacionais como a liberdade, o primado dos cidadãos ou a tolerância. Mais tarde falou-se mesmo da UE como “a Europa dos cidadãos”. Mas Mário Soares e Rui Machete já pediriam a adesãoem 1985 à CEE para que… em Portugal futuros governos ficassem impedidos de opções realmente socialistas. Sabemos hoje como os grandes valores foram ficando para trás. Grandes dirigentes europeus conservadores dessa época, portadores desses grandes ideais, como Giscard d’Éstaing, presidente da UDF, passaram a ser extremamente críticos dos caminhos da UE. Foi ele que nos anos 90, teve reflexão produzida sobre a realização desse projecto, que lhe fez ser o autor do tratado constitucional europeu e depois do projecto da Constituição Europeia, em Julho de 2003, que foi assinado pelos 25 países (entre os quais Portugal através do governo de …Durão Barroso, pois claro!). O projecto de tratado foi abandonado porque a França o rejeitou em referendo (o presidente francês era Jacques Chirac da UMP).Disse Giscard no período cada vez mais problemático da EU que às escondidas dos cidadãos se estaria a construir, em passos sucessivos dissimulados, algo que se escondia aos cidadãos: uma Europa federal, um superestado europeu, em que, passo a passo, se desmontariam gradualmente a soberania, a identidade e, numa última fase, a independência dos países, que seriam lentamente transformados em regiões de um poder quase imperial centrado em Bruxelas.

6.      A natureza da UE foi-se alterando e o Brexit é a reacção a essa degenerescência. Na UE passou a ser usado o medo do desconhecido como argumento a favor da EU. O “salto no escuro” foi frequentemente usado contra o Brexit e fundamentou a “impossibilidade de alternativas”, o “pensamento único”, o “caminho único”. A UE pressionou o parlamento cipriota, não aceitou as escolhas dos gregos em 2015, não aceitou os referendos francês e holandês de 2005, provocou a queda dos governos grego e italiano em 2011, em 2015 impôs a austeridade rigorosa a portugueses e gregos.

7.      As estruturas europeias afastaram-se cada vez mais dos cidadãos, das suas reivindicações e anseios. Não eleitas pelos povos agravaram o carácter burocrático não respeitável e facilmente contestável.

8.     Se quisermos perceber quem decidiu o resultado do referendo, um olhar sobre o mapa das votações indica que foram os eleitores do norte da Inglaterra e os do sul do País de Gales. Zona de influência maioritária trabalhista, de operários ou ex-operários a trabalhar na precariedade, votou contra as orientações do Partido Trabalhista.
9.      Ainda sobre o que esteve na origem do Brexit, não foi o UKIP mas sim o próprio Partido Conservador que o impôs a Cameron com a ajuda da Coroa. O reconhecimento das alterações geoestratégicas ocorridas à escala mundial, a perda da importância relativa dos EUA, e o atrelar do país às guerras da administração norte-amereicana, reduziram o entusiasmo em o UK ser o parceiro privilegiado dos EUA na Europa. Mas também pesaram as sucessivas consequências que tiveram para os ingleses os ataques desde Margaret Tatcher, sem interrupção com Blair, contra o estado social, os rendimentos e outros direitos dos trabalhadores e a capacidade industrial e de demais serviços do Estado em benefício da financiarização do país e na transformação da Bolsa de Londres em algo não recomendável. Os impactos da crise iniciada no sistema financeiro norte-americano, em 2007, e que contaminou todo o mundo, perdurando até aos nossos dias, foi outro factor.
10.  O “projecto europeu”, inicialmente concebido, morreu e o que resta é outra coisa em decomposição mas que tem que ser acompanhada.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Que viva Mexico!


Ontem a cidade do México foi percorrida por uma impressionante manifestação, a “Marcha do Silêncio” contra o governo de Peña Nieto. Na fila da frente seguiam representantes das organizações de trabalhadores e o candidato presidencial derrotado, Lopez Óbrador.

No decorrer   do desfile, convocado “em defesa dos professores ultrajados, feridos, perseguidos ou que perderam a vida”, Andrés Manuel López Obrador, presidente nacional do Morena (Movimento de Regeneração Nacional), propôs  que na última terceira parte do seu mandato, o presidente Peña Nieto dirija um governo de facto de transição, com uma nova atitude que inclua o diálogo e a reconciliação, que permita entregar o poder em 2018 num ambiente de tranquilidade e paz social. A intervenção foi escutada ao longo do Paseo de la Reforma em altifalantes montados em gruas.
Esta manifestação vem na sequência de protestos, alguns dos quais com carácter insurrecional depois do Estado de Oaxaca, no sul do México, ter tornado a viver no dia 19 o pesadelo que o afligiu durante mais de metade do ano de 2006.  Desta vez cenas de guerra entre professores insatisfeitos e as forças de segurança. Após uma semana de bloqueios de estradas por parte dos professores, a polícia dispersou-os com gás lacrimogénio, enquanto os manifestantes reagiram com pedras. Destes acontecimentos resultaram 6 mortes e mais de cem feridos, incluindo 55 policias e pelo menos 50 professores e transeuntes. Houve 25 detenções, que se continuaram a registar nos dias seguintes.

Ainda ontem se organizaram manifestaçõs de apoio aos principais dirigentes  da CNTE, presos em Sonora num Centro de Readaptação Social Federal,  e foi recolhido apoio material para as suas famílias.

A reacção popular foi imediata e os desejos de revolução voltaram a ser expressos nas ruas.
 
A manifestação dos professores contra a dupla avaliação obrigatória, não está isolada no panorama social do país decorrente da política neoliberal do governo, particularmente após a assinatura nos finais de 2013 do Tratado de Livre Comércio entre os Estados Unidos, o Canadá e o México, que mudou radicalmente a situação da economia, do estado e das classes sociais neste país que  é a fronteira latino-americana com o Império. Durante anos o México figurou como um "exemplo" a seguir por todos os países do continente, por supostamente beneficiar das “consequências positivas do comércio livre”. Após a assinatura do Tratado de Livre Comércio entre esses Estados, as desigualdades acentuaram-se, o retrocesso nos direitos e garantias dos trabalhadores e a perda de direitos das populações índias tornaram-se prioridades governamentais.  

Na quarta-feira, segundo a Telesur, membros da organização médica “Yo Soy Medico 17”, de 32 estados, uniram-se ao protesto. Foram 200 mil os que manifestaram a sua oposição também às reformas na Saúde de Peña Nieto, presidente de direita eleito nas últimas presidenciais à tangente contra o candidato apoiado pela esquerda, Lopez Óbrador. Os médicos denunciaram estas reformas como um disfarce para privatizar a saúde no México”. Continuando a citar estes médicos, a Telesur, deu conta de que a violência tem crescido no México e que os seus habitantes têm sofrido as consequências de crimes como sequestros, desaparecimentos forçados e assassinatos que não são punidos.

A Coordenação Nacional de Trabalhadores da Educação (CNTE) – que representa os educadores dos estados do sul predominantemente rurais e indígenas – tem realizado nestes dias manifestações carregadas de um grande dramatismo e bloqueios de estradas contra novas avaliações obrigatórias dos professores, as quais dizem ignorar os desafios das suas regiões enquanto podem conduzir a demissões em massa.
Manifestações idênticas realizaram-se em nove estados com a participação de camponeses, operários e estudantes do magistério.
A comunicação social portuguesa calou-se bem caladinha.

sábado, 25 de junho de 2016

Depois do Brexit, a UE terá de se reconsiderar


O resultado das eleições na Inglaterra, para mim surpreendente atendendo à pressão feita sobre os eleitores, expressa um descontentamento de fundo de que não apenas a extrema direita pode apresentar-se (ou ser apresentada) como beneficiária. A questão não parece ainda estar fechada com a recuperação de iniciativa política por parte dos que perderam o referendo. Mas a decisão dos ingleses deve ser respeitada.
Esse resultado obriga a reflectir, uma vez mais, sobre o modelo de União Europeia que se construiu nestas décadas.

Construído numa lógica capitalista, ela levou ao sempre previsto resultado de os países com menos recursos serem tão só usados como expansões dos mercados dos países mais fortes cujas produções, devidamente amortizadas por esse facto, apresentariam preços de bens e serviços mais competitivos - dimensões da união que basta aos seus promotores - enquanto a liberdade de circulação de pessoas foi permitida q.b. e a elevação dos níveis de vida e de direitos alinhados tendencialmente por cima nunca se verificou.

A moeda única, criando a ilusão de todos os países terem uma moeda forte, agravou a situação, transformando-se em factor de amarração a um centro decisor cada vez mais afastado dos cidadãos, que se apetrechou de tratados, incluindo o Tratado Orçamental,  não votados em cada país, que na prática reduziram a quase nada as soberanias nacionais.
Moeda forte exigiria economia forte e isso foi crescentemente retirado aos mais fracos.
Ela acentuou a redução do crescimento dos países do euro, com os países europeus que estão de fora da Zona Euro a resistirem melhor à crise. Desde 1999 só a Alemanha tem tido um crescimento contínuo do PIB entre todos os países europeus. As quedas foram particularmente graves na Grécia, na Finlândia, Espanha, Portugal e Itália. O euro contribuiu para o empobrecimento de grande parte da Europa e o mesmo efeito destrutivo teve sobre o investimento produtivo. Prosseguindo esta via, a Europa será destruída pelo euro.
Salientando-se neste momento a importância da saída da Grã-Bretanha da UE, e atendendo à necessidade de o governo acautelar os interesses do país e dos seus imigrantes nela, importa não retirar da ordem do dia a questão da reconsideração da posição de Portugal em relação ao euro.

Países como Portugal, viram, na voragem da lógica dos mercados capitalistas, desaparecer as suas pescas, o valor, que poderia ter sido acrescido numa lógica de modernidade, da agricultura em que trabalhou a maioria da população do interior e de boa parte do litoral, a indústria metalúrgica e metalomecânica, a indústria naval (de que os mais ricos obviamente não prescindiram) e indústrias de diversos sectores como as extractivas. Os próprios fundos estruturais não tiveram um efeito significativo no contrariar dessa lógica, tendo mesmo servido, no crescimento da rodovia de longo curso, para descer o valor dos preços dos produtos, face aos praticados pelos nossos produtores, para quem demandava os nossos mercados, que não resistiram à concorrência desleal.

A amarração a um centro cada vez menos democrático fez da UE a NATO económica. Mesmo no sentido militar do termo. A UE foi amarrada pelos EUA a um dos mais loucos projectos da história contemporânea de manter uma situação de guerra permanente do Mar Adriático ao Mar Negro, no Médio Oriente e parte do Próximo Oriente, no Magrebe com as "primaveras árabes", África Central e Corno de África.
Alternativas de acordos, já em curso ou potenciais, mutuamente vantajosos de países europeus com um tão largo número de países foram destruídas.

Portugal e os restantes países europeus enfrentaram duas grades vagas de imigrantes neste século: económicos dos países do leste europeu depois das privatizações selvagens depois da queda do socialismo, e de refugiados com imigrantes económicos dos países sujeitos a guerras no Médio e Próximo Oriente. Esta UE teve altas responsabilidades nas causas destes acontecimentos. O seu acolhimento em condições adequadas pelo governos da UE impõe-se. Mas a dimensão do fenómeno criou acantonamentos de refugiados, por vezes já existentes dentro de alguns países europeus, não permite ainda avaliar as consequências. A direita tirará proveito deles mas a esquerda irá lutar para que sejam democracias renovadas e não fascismos reciclados a influenciar os processos políticos à escala de cada país e do continente.

Os EUA há muito que discutem com a Europa - uma vez mais no segredo dos deuses -  a criação do TTIP (Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento).
Com o TTIP estaria a porta aberta à liberalização e privatização dos serviços públicos em áreas como a educação, a água, a energia, os resíduos sólidos. A liberalização dos serviços financeiros e da circulação de capitais, provocaria a diminuição de mecanismos de controlo, de supervisão e salvaguarda. E seria remetida para instâncias internacionais o julgamento dos conflitos com as multinacionais que poderiam interpor acções contra os estados. O TTIP prevê ainda recuos nos padrões de exigência e controlo na área da segurança e higiene alimentar, assim como no campo ambiental, abolindo regras em áreas como a obrigatoriedade de avaliações de impacto ambiental ou princípio da precaução. Enfim perderíamos a voz neste lamaçal.

Em contrapartida, mais a oriente a paz consolida-se com a cooperação e o desenvolvimento.
Os dirigentes russos apostam na  cooperação bilateral entre Moscovo e Pequim, que cobre já uma razoável variedade de áreas, incluindo o comércio, energia e infraestruturas.
Embora no passado tenha havido relações menos conseguidas, hoje o campo de cooperação mùtuamente vantajosa e aberto a outros países está firme.
Por isso Putin reconheceu que, por exemplo,  os membros da União Económica da Eurásia (EEU) concordam em reforçar a cooperação com a China dentro do quadro de cooperação "A rota da seda" proposto pelo presidente chinês, Xi Jinping. Para Putin, a Rota da Seda económica é uma iniciativa "muito bem cronometrada e atraente", que tem "grande potencial".  Afirmou-o recentemente numa reunião da EEU em Astana, capital do Cazaquistão, com a Arménia, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão e Rússia, que manifestou o seu apoio à realização da cooperação com a China no âmbito da Rota da Seda. O mesmo fez a Mongólia que com ambos os países acordou num corredor Rússia-Mongólia-China.
Na primeira fase de cooperação, quer a EEU quer a China podem configurar uma zona de comércio livre, sendo que o caminho fundamental do desenvolvimento económico mundial e da cooperação EEU-China é promover a abertura a mais países da região interessados em entrar no projecto. Putin afirmou que desejariam " tentar evitar o estabelecimento de um bloco económico e comercial fechado".

Frase de fim de semana, por Jorge

"Status quos are made to be broken."
"Os status quo's fazem-se para serem quebrados"

Ray A. Davis
escritor americano contemporâneo

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Uma aldeia francesa


 
Segui com interesse esta série na RTP-2 porque trocou a História pelas pessoas que a fizeram e porque à escala europeia, e não só, produções para cinema ou TV sobre as resistências ao nazismo no decurso da 2ª Guerra Mundial não se têm feito.

Por outro lado, na imprensa e através de comentadores políticos que têm acesso a esse estatuto, esta questão passou a estar diluída nos assim designados “extremismos da esquerda e direita, na igualdade entra comunismo e nazismo”, corrupção intelectual de alguns historiadores dos tempos do neo-liberalismo.

O guião, interpretações e realização são adequados ao que se poderia esperar nestas séries.

Como qualquer série televisiva ela apresenta a visão não dos vencedores mas de quem pagou a produção.

A série é uma ficção em que o conhecimento histórico reconhece comportamentos e percursos de personagens mas não ao nível absoluto ou de caricatura do guião.

Entre os nazis não houve gente que teve um comportamento mais decente com autoridades de Vichy ou mesmo populares? Terão havido mas essa não foi a característica geral. Houve comunistas sectários, insensíveis às preocupações das populações? Terão havido mas numa pequena proporção. A acção da resistência, quer comunista quer a gaullista foi muito caracterizada pela anarquia e a responsabilidade? Essa é uma aberrante caricatura que ignora o seu papel e as muitas mortes de resistência nas acções. A aldrabice foi a característica das novas autoridades, compostas naturalmente por resistentes, criadas no anterior território de Vichy? Terão havido casos mas essa não foi a característica dominante. Houve torturadores nazis e assassinos da polícia de Vichy com manifestações de compreensão para com aqueles que eram as suas vítimas? É altamente improvável. Os judeus foram todos perseguidos ou alguns trabalharam para a Gestapo, SS e polícia de Vichy para que muitos judeus fossem marginalizados e depois deportados para campos de concentração e aí mortos? Sabemos que, infelizmente, houve casos desses. A série poderia ter feito alusão a esses campos de “solução final”? Deveria porque na altura da proximidade da libertação, o seu conhecimento, mesmo sem pormenores, já era conhecido. A execução de traidores e colaboracionistas e a humilhação a que foram expostas publicamente mulheres que se entenderam com o inimigo é um exagero? Se forem julgados setenta anos depois num bom sofá, completamente fora do contexto, pode haver quem tenha esse entendimento. Mas não o teve quem viveu esses tempos, no calor dos combates e das perseguições e mortes.

A série devia ter cuidado deste efeito sempre perverso de julgar noutro contexto acontecimentos que foram trágicos no contexto original.

E não vindo muito a propósito, a miopia política é uma coisa séria, sobretudo se só dá num olho. Há dias Júlio Machado Vaz, no seu programa na Antena Um, referia que a História não pode esquecer os massacres de Katyn, na Polónia. Estes massacres vitimaram em 1940  mais de vinte mil militares polacos, que eram dirigidos num quadro de entendimento com os nazis contra os russos, cuja sepultura os nazis denunciaram, e que só há poucos anos atrás o presidente russo reconheceu terem sido um crime dos dirigentes de então do seu país, tendo por isso pedido desculpa às autoridades e ao povo polaco.

Júlio Machado Vaz poderia ter referido também os massacres, de dimensão muito superior ocorridos com as bombas atómicas em Hiroshima e Nagasaki em 1945, em relação aos quais Obama há poucos dias no Japão, em homenagem a essas vítimas, não pediu desculpa ao povo japonês nem caracterizou esse genocídio como um crime.
Dir-se-á que são critérios. Porém a verdade histórica existe, por vezes com nuances de interpretação, que seguramente não vieram à liça nos casos relatados.
 

 

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Os senhores CGD


Vogal de CAs num dos períodos mais conturbados da CGD

O PS e o PSD partilharam ao longo dos anos os lugares de presidente e vice-presidente bem como vogais da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Excepção feita a um pequeno período depois do 25 de Abril até 1976.

 
 
 
 
 
Foram presidentes:

Jacinto Nunes (PSD) de 1976 a 1980

Oliveira Pinto (PS) de 1980 a 1989

Rui Vilar (PS) de 1989 a 1995

João Salgueiro de 1996 a 1999

António Sousa (PSD) de 2000 a 2004

Vítor Martins (PSD) de 2004 a 2005

Carlos Santos Ferreira (PS) de 2005 a 2007

Faria Oliveira (PSD) de 2008 a 2013

Álvaro Nascimento (PSD) de 201a a 2015

São muitos os membros do PS, PSD e até CDS que passaram pela CGD nas últimas décadas. Entre eles, além dos já referidos, alguns dos mais conhecidos foram: Tavares Moreira, Sousa Franco, Maldonado Gonelha, Carlos Tavares, Carlos Costa, Alexandre Vaz Pinto, Tomás Correia, Mira Amaral, Almerindo Marques, Alves Monteiro, Celeste Cardona, Armando Vara, António Nogueira Leite, e Nuno Fernandes Thomaz (este do CDS). Alguns destes passaram depois para administradores de outros bancos…

Carlos Costa, o actual Governador do Banco de Portugal, foi membro vogal de 3 Conselhos de Administração da CGD entre 7 de Abril de 2004 a 30 de Setembro de 2006, um dos períodos mais problemáticos da Caixa Geral de Depósitos.

domingo, 19 de junho de 2016

Depois da grande manifestação de dia 14 em Paris, govereno francês aceita conversar


A manifestação promovida pela CGT em Paris na passada 3ª feira terá juntado cerca de um milhão de trabalhadores, segundo o secretário-geral da CGT Philippe Martinez. Tratou-se da oitava jornada nacional de luta desde que o governo “socialista” de Hollande-Valls decidiu avançar com nova legislação laboral que seria um rude golpe dos direitos e condições de vida dos trabalhadores.

Os trabalhadores têm sido de uma grande firmeza na afirmação das suas razões e todas as tentativas do governo os dividir, inclusivamente com a ameaça à requisição civil. Depois de dia 14 um grupo de provocadores causou sérias perturbações no funcionamento do Hospital de Vecker, em Paris. Hollande e Valls ameaçaram proibir futuras manifestações “analisando-as caso a caso”.

O governo francês não tem dado ordens à polícia para isolar os grupos provocadores das manifestações, apesar da CGT, insistentemente o ter solicitado. Foi, por isso, de um grande cinismo o comentário de Hollande de que a CGT tinha uma atitude “ambígua” face à vandalização promovida por esses grupos. Philippe Martinez, secretário-geral da CGT, tem repetidamente condenado essas acções violentas e afirmado que nada têm a ver com a CGT.

Estes grupos, com é sabido internacionalmente, são não só tolerados mas também criados e infiltrados por agentes da polícia, que se fazem passar por manifestantes, com bandeiras e dísticos seus. A sua função é a vandalização e darem oportunidade para jornalistas fazerem fotos, que criam na opinião pública uma pressão contra os manifestantes e os seus objectivos de luta. No caso de França, estas acções podem ser aproveitadas para medidas repressivas, previstas no “estado de emergência” que há muitos meses vigora no país.

A amálgama entre o acto terrorista cometido na segunda-feira em Magnanville  (Yvelines), as acções de grupos de hooligans no Euro 2016, e as acções destes provocadores ao lado de manifestações sindicais, Pode o governo querer aproveitar para ir mais longe no cerceamento das liberdades.

Como o Le Monde de sábado refere, um deputado do Partido Socialista, Christian Paul lembrou “a liberdade de manifestação não é negociável e “não pode ser sacrificada às provocações. Criticando a "teimosia" do governo, e  seu camarada Benoît Hamon aconselhou este a "reabrir as negociações", e afirmando que” o serviço de ordem da CGT não pode fazer o trabalho que a própria polícia não faz”.  

A Ministra do Trabalho, Myriam El Khomri, foi, nestas circunstâncias, e depois da grande manif de dia 14 e de estarem agendadas para dias 23 e 28 manifestações ainda mais firmes, forçada a abrir a porta ao diálogo, convocando o líder da CGT para uma reunião que teve lugar neste sábado.

Antes da reunião, Philippe Martínez congratulou-se com a proposta, vendo-a como «um progresso» na posição do governo. «Há três meses que pedimos para discutir com o governo. Registamos com satisfação que agora isso é possível», disse o dirigente sindical, sublinhando que há trabalhadores em greve há mais de 20 dias. Já depois da reunião, representantes da CGT referiram que tinham pedido a suspensão da proposta de lei do governo em debate no parlamento e a abertura de negociações para voltar a escrever um diploma e que entregaram à Ministra como contributo para essa discussão uma proposta da CGT sobre o Código do Trabalho para o século XXI. A Ministra afirmou Aos dirigentes sindicais que essas eram propostas sérias e construtivas.

Apesar desta aparente abertura, e porque fica a aguardar resposta às suas propostas, a CGT decidiu manter as jornadas de dias 23 e 28, esta última data em que está previsto ser entregue ao Presidente da República o resultado da votação cidadã que a CGT tem estado a promover em todo o país sobre o sim ou não à proposta de Código de Trabalho do governo

sexta-feira, 17 de junho de 2016

O exercício militar na Polónia da NATO, Anakonda 16, terminou mas a provocação continua


Começou dia 6 e terminou hoje, dia 17, na Polónia o Anakonda 16, "o maior exercício aliado deste ano".
Nele participaram mais de 25.000 homens de 19 países da NATO (EUA, Alemanha, Grã-Bretanha, Turquia e outros) e 6 parceiros: Geórgia, Ucrânia e Kosovo (reconhecido como um estado), na verdade sob o comando dos Estados Unidos; a Macedónia, que ainda não está na NATO apenas porque a Grécia se opõe à utilização do nome do nome (o mesmo que o de uma província grega, que a Macedónia poderia reivindicar); A Suécia e a Finlândia, que estão a ficar cada vez mais perto da NATO (e que participaram na reunião de Maio de chefes de governo da Aliança).
Formalmente o nome do exercício foi induzido pela Polónia (a partir do "k" no nome), para atender ao orgulho nacional de Varsóvia.
Numa escola primária polaca o Anaconda 16 instrumentalizou cranças
 
Na realidade o comando do exército dos EUA/ Europa, com uma "área de responsabilidade '' que compreende 51 países (incluindo toda a Rússia), tem a missão oficial de" promover os interesses estratégicos americanos na Europa e Eurásia. " Anualmente realiza mais de 1.000 operações militares em mais de 40 países da região.
O  exército dos EUA/Europa participa no exercício, com as suas 18 unidades, incluindo a 173ª Brigada Aerotransportada em Vicenza, na Itália. O Anakonda 16, que decorreu até hoje, foi claramente dirigido contra a Rússia. Incluiu "missões de combate das forças multinacionais no ar" e também na área do Báltico, perto do território russo. Na véspera do Anakonda 16, Varsóvia anunciou que em 2017 vai expandir as forças armadas polacas de 100 para 150 000 homens, formando uma força para-militar de 35.000 homens chamada "força de defesa territorial." Esta estará distribuída em todas as províncias começando com a oriental, que terá a tarefa de "impedir a Rússia de se apoderar do território polaco, como fez na Ucrânia."
Os membros da nova força, que receberá um salário mensal, serão treinados, a partir de Setembro, por instrutores dos EUA e da NATO de acordo com o modelo adotado na Ucrânia, onde treinam os batalhões da Guarda Nacional que incluem neo-nazis. A associação paramilitar polaca Strzelec, com mais de 10.000 homens vai constituir a espinha dorsal da nova força, e já começou a treinar participando no Anakonda 16. A criação da força paramilitar, que fornece internamente ao presidente Andrzej Duda uma nova ferramenta para suprimir a oposição, é parte do referido crescimento militar da Polónia, com um custo estimado de 34 mil milhões de dólares até 2022, e é encorajada pelos EUA e NATO na função anti-russa.
Já começou o trabalho para instalar na Polónia uma bateria de mísseis terrestres do sistema norte-americano Aegis, semelhante à que já opera na Roménia, que pode lançar dois mísseis mísseis interceptores de um ataque nuclear.

Tudo à espera  da cimeira da NATO em Varsóvia (8 e 9 de Julho), que formalizará a escalada anti-Rússia, o Pentágono está a preparar-se para implantar na Europa uma brigada de combate de 5.000 homens  entre a Polónia e os países bálticos.
O Ministério da Defesa de Portugal, no seu site, não se refere à operação Anaconda 16 nem à participação que nela terão tido as nossas forças armadas, referindo, sim,  que "a reunião dos Ministros da Defesa" que terminou no passado dia 15 "antecede a Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da NATO, que irá ter lugar em Varsóvia nos próximos dias 8 e 9 de ´Julho, e que  se constituiu, assim, num momento essencial de preparação das principais decisões que definirão os rumos da Aliança Atlântica para o futuro. A“Cimeira de Varsóvia” será a 27ª desde que a aliança foi criada em 1949; a última, teve lugar no País de Gales, no Reino Unido, em 2014. Nada é referido no site sobre o carácter anti-russo desta cimeira.
Intensificaram-se ao mesmo tempo, os exercícios da NATO/EUA contra a Rússia: em 5 de junho, dois dias antes do Anakonda 16 ter começado, iniciou-se no mar Báltico a Baltops 16, com  6100 militares, 45 navios e 60 aviões de guerra de 17 países (incluindo a Itália), sob o comando dos EUA. Neles também participaram os bombardeiros estratégicos americanos B-52. A cerca de 100 milhas do território russo de Kalininegrado...
Uma nova escalada da estratégia de tensão, que empurra a Europa para um confronto não menos perigoso do que a Guerra Fria. Sob o silêncio política político-mediático das "grandes democracias ocidentais."

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Uma vez mais Tribunal de Contas, ADSE e SNS


Num relatório de auditoria, o Tribunal de Contas (TdC) continua a reconhecer que a ADSE é um sistema complementar ao SNS, à semelhança dos seguros de saúde, que não se pretende substituir ao SNS, e que é por opção própria que os trabalhadores da Função Pública nela se inscrevem apesar de, por descontos que realizam para a segurança social, poderem ser utentes do SNS.
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Vitor Caldeira, presidente do TdC

O TdC entende que “a ADSE deverá ser excluída das disputas ideológicas que opõem o setor público de prestação de cuidados de saúde ao privado, e vice-versa “. Porém o TdC não pode ignorar que já em relatório anterior, citava o estudo da Entidade Reguladora do Sistema de Saúde, que reconhecia que a subida de descontos para os 3,5% da ADSE tinha feito fugir aderentes desta para seguros privados de saúde, para então defender um alargamento da base de aderentes à ADSE que já aqui criticamos em Março e que na presente auditoria ao seguimento desse relatório é retomado.
Por decisão de José Sócrates de 2010, a ADSE deixou de receber transferências do Orçamento do Estado para pagar cuidados de saúde prestados aos seus beneficiários nos serviços públicos de saúde nacionais e regionais. Foi na esteira desta decisão que o anterior director-geral da ADSE, Carlos Liberato Batista, do PSD, nunca reconheceu qualquer obrigação perante os gastos do serviço regional de saúde da Madeira, desde Dezembro de 2009 e Setembro de 2015, data do relatório de auditoria do TdC de Setembro de 2015. Relatório de que a presente auditoria é seguimento das Recomendações então formuladas (Relatório n.º 12/2015 – 2ª Secção). É ainda na sequência de tais factos que o TdC considera que o governos regional da Madeira e o governo de Passos Coelho usaram indevidamente dinheiro da ADSE para pagar despesas do SNS.

Desta vez o TdC sublinha que “ao tornar os quotizados da ADSE os financiadores exclusivos do sistema em 2014, o Estado alterou a natureza do financiamento, “privatizando” a receita.” (refere-se a deliberação do governo de Passos Coelho nesse sentido). Talvez por isso o TdC não tem referido que a ADSE tem funcionado como uma grande seguradora de saúde privada que é sustentáculo muito importante para hospitais e clínicas privados, que sem ela não sobreviveriam por méritos próprios. E naturalmente vem referir agora, quando existe um governo diferente do anterior, ser uma ameaça ao futuro da ADSE “o entendimento do Ministro da Saúde de que rendimento disponível dos trabalhadores e aposentados da função pública, entregue voluntariamente à ADSE sob a forma de desconto, poder ser utilizado para financiar o Serviço Nacional de Saúde”

O TdC continua, uma vez mais a defender o que defendia quando o anterior governo governava, com um parecer da ERS que fundamentava, sem o dizer, o debilitar progressivo do SNS por captação de utentes seus para soluções de fornecimento de serviços de saúde privados, enquanto os mais ricos da ADSE passavam para seguradoras. É uma atitude coerente com a do relatório de 2015 mas o SNS irá sobreviver, vencendo este canto de cisme.

 

segunda-feira, 13 de junho de 2016

As dificuldades impostas às economias emergentes para recuperarem do atraso

 
Recuperar do atraso é difícil.
Tendo passado mais de um século a ver o seu rendimento cair face aos países ricos, com a exploração neo-colonial, a pilhagem de produtos agrícolas, de recursos florestais e de recursos energéticos a que EUA e outros países ricos acederam por “concessão da exploração” (leia-se: ou concordas ou há sarilhos…) muitos países em vias de desenvolvimento ao longo dos últimos vinte anos deram passos para se aproximarem deles. No entanto, a recuperação do passado tem abrandado consideravelmente.
O domínio da economia mundial não é aceite facilmente por aqueles que a têm dominado quase sem concorrência desde o final do século passado.
 
O relatório semestral de Junho do Banco Mundial mostrou que a velocidade a que os mercados emergentes estão a convergir para o rendimento do mundo rico caiu  em poucos anos, mesmo antes da crise financeira, cujas consequências, apesar das causas se terem gerado nos EUA, se propagaram a todo o mundo.
Uma vez mais se confirmou que o domínio do dólar na economia mundial e a intervenção imperialista nos mercados como arma política, dificultam muito esse objectivo. Mesmo quando a China e a Rússia, por um lado, e os BRICS no seu conjunto, por outro, ensaiaram alternativas, logo a pressão política em países do leste europeu, como a Ucrânia, se fizeram sentir contra a Rússia e os cidadãos russos desses países. A independência da Crimeia e a sua reintegração na Rússia viriam a justificar o embargo norte-americano (a que a Comissão Europeia servilmente se associou) à Rússia, para quem (e não só) Obama negociou com a Arábia Saudita uma drástica redução dos preços do petróleo, de efeitos muito negativos para ela e outros países produtores mas positivos para outros países emergentes não produtores. Por outro lado, a China Railway qualificou na sexta-feira como "um erro" e "irresponsável" o cancelamento unilateral por parte da norte-americana XpressWest do contrato para uma subsidiária do grupo chinês construir um trem de alta velocidade. Por outro lado, ainda, o Brasil e a Venezuela, com papel muito importante no desenvolvimento da América Latina, têm sido vítimas ao longo dos últimos anos de processos golpistas para eliminar governos de esquerda que contribuíram pelas suas dinâmicas políticas para a convergência com os países mais ricos.
 
É claro que é evidente uma política virada contra o relacionamento com os países emergentes, uma guerra com várias vertentes que exclui para já a a via militar directa. A guerra incui a guerra energética, a guerra geo-financeira, a guerra das divisas, para além de outras operações no campo da cibernética e da propaganda.
A Rússia elevou, entretanto em muito a exportação de petróleo para a China que esta manterá como reserva estratégica. As exportações de petróleo russo para a China atingiram um record, o que parece dar outra solidez à complementaridade eventual entre os projectos de bolsas petrolíferas: uma em S. Petersburgo e outra em Xangai.
Para os propagandistas ocidentais, não haveria solução mágica para levantar os mercados emergentes como um todo para um caminho de maior crescimento. Segundo eles, como o britânico Finantial Times, no seu editorial do passado dia 8, muitos beneficiariam da introdução de uma maior previsibilidade e transparência na elaboração de políticas, para que os consumidores, as empresas nacionais e investidores estrangeiros tivessem um ambiente mais confiável ( onde já ouvimos isto?)

Para este tipo de imprensa, a que juntaria a propósito das “leituras” deste relatório os casos domésticos do Expresso e do Negócios, por onde passei os olhos, poucos assuntos em que as panaceias da economia convencional se revelaram tão espetacularmente erradas por tanto tempo como a afirmação de que os países pobres devem recuperar do atraso para com os ricos (é o Finantial Times que o diz!!!).
Com a retoma do investimento e a adopção de novas tecnologias muito superiores às das  economias maduras, a recuperação do atraso deveria ter sido uma simples questão de deixar os mercados fazerem o seu trabalho (Deveria? Pergunto eu…)
E o jornal continua referindo que a situação estava a mudar, no entanto, e não apenas na China.

Quando a crise financeira global atingiu o mundo em 2008, cerca de 80 por cento das economias emergentes estavam a convergir para níveis do produto interno bruto per capita próximos do dos EUA, duplicando a proporção do início de 1990.
Mas esses dias positivos têm diminuído.
Desde 2008, a proporção de países que recuperou o atraso em relação aos EUA caiu para os níveis de 1990. Entre 2003 e 2008, os mercados emergentes, foram crescendo, em média, a uma taxa que teria apanhado até 2015 os níveis do PIB per capita dos EUA per capita em 40 anos. Em 2013-2015, essa lapso de tempo já se tinha alargado para mais de 60 anos.
Valendo a pena então perguntar a quem deu jeito esta crise e quem não sofreu tanto como isso com ela.
Continua o Finantial Times, tirando uma crítica da cartola, que o ambiente de grande apoio para muitos mercados emergentes nos primeiros anos após a crise - altos preços das commodities (1) e empréstimos externos baratos, em parte graças à flexibilização da Reserva Federal, é preocupante que não tenham feito mais progressos. Agora que esses apoios têm diminuído, a sua tarefa tornou-se ainda mais difícil.
Para o jornal as condições gerais que podem ajudar os mercados emergentes a voltar à estrada são bem conhecidas: a desregulamentação se for caso disso, a política macroeconómica de apoio onde for possível. Lá está a receita do costume.
O Expresso e o Negócios até chegaram a afirmar que os países ricos do Ocidente estão a puxar pela recuperação dos países em desenvolvimento.
Fazendo a interpretação do relatório, o Finantial Times refere que a volatilidade nos mercados financeiros em 2015 e no início deste ano se deveu muito à incerteza na China, e, particularmente, como as autoridades chinesas reagiram à fuga de capitais e às pressões sobre o renminbi. Queria que a China não reagisse? Na passada semana, o Banco Popular da China deixou a "taxa de referência" e adoptou um cabaz de outras moedas que levou a um deslizar consideravelmente menor do que os comerciantes esperavam, e o seu compromisso pôs em causa uma taxa determinada pelo mercado. O movimento não foi dramático, mas, para o Finantial Times,  adicionou incerteza a um processo político muito importante que deveria ser mais transparente. Mas estes cavalheiros já se esqueceram que foi a China que aguentou a economia mundial quando do baque vindo da Wall Street?
São hoje menos as nações em vias de desenvolvimento que estão a convergir com as economias ricas. Mas dinheiro para a guerra abunda cada vez mais nos países ricos do “Ocidente”. Então o dinheiro para alimentar as guerras não podia já ter sido utilizado para alterar esta situação?
Não, os EUA optaram pela guerra económica e financeira contra estes países, acentuaram a uniformização temática informativa, definiram estratégias de apoios a uns e abandono de outros. Como mais uma vez se verificou na passada reunião dos G7. 
Nas últimas semanas é evidente que o reforço da capacidade do Daesh e Al Nusra, depois das derrotas que lhe têm sido infligidas,  revela um jogo duplo dos EUA e da França, nomeadamente. Vale tudo mesmo quando neste relatório do BM nos Estados Unidos, se verifica um declínio acentuado no investimento do sector da energia e que  as exportações mais fracas levaram à redução na previsão de crescimento em 0,8 pontos percentuais, ficando em 1,9%, enquanto a zona euro registou uma ligeira queda para 1,6%, apesar do apoio da política monetária e preços mais baixos das commodities.
Mas os senhores da guerra insistem. Vejamos o que nos diz o francês La Tribune do passado dia 9: “O Conselho das Indústrias de Defesa Francesas (CIDEF) reclama que o esforço na defesa, excluando as pensões, seja rapidamente elevado para 2% do PIB. E deseja particularmente que o Estado consagre no mínimo 24 mil milhões de euros por ano a equipamentos e preparação do futuro…Desde 1990, a redução da parte da riqueza nacional consagrada à Defesa  fragilizou muito os equipamentos militares e multiplicou as faltas de capacidade, ao ponto de transformar a actual LPM numa lei de sobrevivência. A próxima LPM deve ser a da renovação, assinalando o regresso rápido aos 2% do PIB, sem pensões, para o funcionamento das forças armadas”.
 
(1) Refere-se a transações comerciais na bolsa de valores de produtos de origem primária, relativas a produtos de qualidade e características uniformes, que não são diferenciados de acordo com quem os produziu ou da sua origem, sendo o seu preço determinado de forma uniforme pela oferta e procura internacionais.