Portugal e outros países que têm relações comerciais com a China sofrerão impactos da decisão de desvalorização do yuan. Se não tivéssemos perdido a nossa soberania cambial com o euro, valorizaríamos ou desvalorizaríamos o escudo de acordo com os interesses do país. Foi o que a China fez e o que Portugal e os países da zona euro deixaram de poder fazer, ainda por cima num quadro de debilidade desigual das economias europeias.
Debilidade que tem feito as maiores potências agravarem as condições de empréstimos condicionados (resgates) em relação à mais fracas e a alargar o número dos que defendem que devem ser preparadas saídas do euro que não deixem a faca e o queijo nas mãos da Alemanha para agravar ainda mais a situação dos países mais fracos.
A desvalorização do yuan, ao contrário do que a expressão pode induzir na opinião pública, nomeadamente acompanhada por comentaristas da imprensa ocidental como no Guardian, está a ser um teste à ascensão da China como grande potência mundial, segundo afirma Ariel N. Rodriguez, economista e comentador de relações económicas internacionais.
Para ele " Depois da desvalorização do yuan, os mercados financeiros internacionais começaram a tremer. Washington acusa Pequim de deslealdade na obtenção de vantagens comerciais. Porém, a China não está interessada no prolongar da desvalorização. Por outro lado, se rebentasse uma guerra de divisas, o governo chinês corria o risco de agravar as tensões e económicas e geopolíticas no seio dos países da Ásia-Pacífico. Se isso acontecesse os EUA teriam mais possibilidades de desmantelar as iniciativas de cooperação regional e de boicotar a ascensão da China como potência mundial".
As três desvalorizações do yuan na primeira quinzena deste mês levaram ao pânico dos mercados financeiros durante alguns dias, apesar de não terem ultrapassado os 5%.
Quando em 2005 o regime de taxas de intercâmbio se tornou mais flexível, até aos dias de hoje, o yuan valorizou-se cerca de 30% em relação ao dólar, e não seria agora que uma desvalorização do yuan em relação ao dólar de 4,6 % pudesse ser considerada como a principal causa do afundamento da economia dos EUA.
Nos momentos de crise e recessão mundial as instituições responsáveis pela política monetária decidem unilateralmente para empurrar as respectivas economias. E a Reserva Federal dos EUA (FED) é, de longe quem melhor o ilustra. Em Dezembro de 2013, o seu anterior presidente Ben S. Bernanke, sem consulta aos outros bancos centrais e ao Congresso, anunciou a diminuição do programa de liquidez ("Quantitative Easing"), o que provocou o afundamento dos mercados bolsistas e as taxas das divisas das economias emergentes. A economia chinesa continua muito ligada à cotação dólar norte-americano.
De meados de 2014 ao início de 2015, o dólar valorizou-se entre 15 e 20% contra as moedas de outros países que mais se trocam (euro, libra esterlina, yen, etc.) e apenas 0,6% em relação ao Yuan.
No início deste ano, a China estava pronta para contrabalançar o domínio do dólar no Sitema Monetário Internacional. Em 2009 já o governador do Banco Popular da China tinha feito um apelo à reforma do sistema mundial de reservas, já que as flutuações violentas do dólar impunham que se desse mais confiança e estabilidade à economia mundial. A China recusava-se, pois, a pagar os custos da crise gerada a partir da Bolsa de Nova Iorque. Depois disso, a agência noticiosa Xinhua lançou um debate em Outubro de 20013 sobre a "desamericanização" do mundo. De facto a política irresponsável de endividamento de Obama estava a provocar o aumento dos "desequilíbrios estruturais". Em Março do presente ano, Le Kequiang, Primeiro Ministro da China pediu ao FMI a abertura de discussões sobre a incorporação do yuan nos Direitos de Saque Especiais, cabaz de moedas de reserva criado pelo FMI em 1699. Para a China era claro que o valor da sua moeda deveria ficar estável, condição exigível a qualquer moeda de reserva mundial. E isto porque o dólar tinha desrespeitado esta exigência, quando fez cair as reservas de câmbio dos bancos centrais entre 1999 e 2014.
(concluiremos este artigo amanhã, com um terceiro post "As razões da China")