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domingo, 13 de março de 2016

Começam amanhã as conversações de paz sobre a Síria na cidade de Genebra, sob a égide da ONU

 

A Síria e os países vizinhos
O enviado especial da ONU para a Síria
anunciou esta sexta-feira, em Moscovo, que as Nações Unidas vão organizar eleições presidenciais e legislativas no país, no prazo de 18 meses a partir de segunda-feira. Staffan de Mistura falava à agência noticiosa russa Ria Novosti sobre os principais temas em discussão para pôr fim a cinco anos de guerra na Síria nas próximas negociações de paz, que vão decorrer em Genebra entre 14 e 24 de março, depois do cessar-fogo desde 27 de Fevereiro passado.
Segundo de Mistura irão ser discutidos um novo governo inclusivo, uma nova Constituição e novas eleições, que devem realizar-se no prazo de 18 meses a contar do início das negociações", que se iniciam amanhã segunda-feira.

 
Este processo não tem sido fácil. Teve avanços e recuos e a sua própria realização a partir de amanhã não oferece garantias de um sucesso final. Depois do cessar-fogo de dia 27 de Fevereiro é certo que os combates se terão reduzido em 80 ou 90% mas as acusações de violações cruzaram-se. Não se vê, porém, que haja outro caminho senão trabalhar para a paz na base de compromissos aceites por todas as partes. Ao papel importante que a Rússia e os  EUA têm tido, juntam-se amanhã o governo sírio e cerca de cem grupos que aceitaram participar nas negociações. As perturbações irão existir do exterior e a cobertura mediática ocidental irá confundir várias questões. Ainda há pouco, ouvia na Antena Um, que sempre confundiu os seus ouvintes, que um dirigente da oposição (sem identificação pessoal nem de grupo) declarara que "Assad tem que sair, vivo ou morto, mas tem de sair". Esta será a posição do Estado Islâmico (Daesh) ou da sucedânea da Al Qaeda, a Frente Al-Nusra, que não estarão nas negociações, tal como foram excluídos do cessar-fogo pela ONU e que continuam o terrorismo na Síria, pelo que não foi questionado que esses grupos fossem combatidos pela Síria, a Rússia e os EUA.
Os compromissos a que se chegar coexistirão, não sem algumas contradições, com os acordos importantes que o Irão e os EUA estabeleceram e que transcendem as relações bilaterais
 
O petróleo e as questões geo-estratégicas são motivações omnipresentes.

 
O domínio da exploração do petróleo e da distribuição deste (crude) e do gás natural no M. Oriente, na Europa e no mundo, por potências regionais e outras ocidentais que detêm contratos para o efeito, é, em última análise,a grande causa dos conflitos presentes.
Mapa étnico e religioso da Síria
A Rússia que, como outros, tem os seus interesses (fronteiras seguras, comercialização do gás natural para a Europa, petróleo), o mesmo se passando com o Irão (fim do embargo), com a Síria (que há décadas não se submete a interesses neocoloniais da França e do Ocidente em geral, e que tem tido na Rússia e antes na URSS um aliado de décadas) ou como o Iraque (destruído, vítima da Al-Qaeda e do Daesh, que combate, com  apoio norte-americano que às vezes não convence), onde ainda ontem o Daesh provocou mortes com o uso de armas químicas, tendo o governo prometido "vingança". Ou os de vários grupos de curdos da Síria, Iraque e Turquia, que se têm mantido autónomos, apesar de serem instrumentalizados para formar um grande Curdistão, com base em territórios desses três países, e procurando neles aprofundar as autonomias.
Mas também com Israel. Enquanto a Arábia Saudita e os outros países árabes ricos  ainda  dominam a produção e os preços. A família Saoun decidiu adquirir a bomba atómica a Israel. E a Turquia, de Erdogan, cada vez mais uma férrea ditadura
Campo de refugiados sírios na Jordânia
, com sonhos imperiais fracassados, que foi o grande apoiante do Daesh na Síria e beneficiou de muito petróleo que ele saqueou. E que há dois dias queimou habitantes curdos até à morte em Cizre.
Os interesses dos povos de uma série de países foram esmagados devido à passagem de repúblicas modernas e de razoáveis condições de vida para um inferno de destruição, morte e grandes carências, depois de invasões destruidoras e das chamadas “primaveras árabes que levaram a “crise dos refugiados” às dimensões atuais, tornando-se, em si mesma, um muito sério problema internacional.
 
Para além da questão do petróleo e gás natural, também tem grande influência neste conflito
domínio de uma zona geoestratégica, desde há muitos anos, particularmente depois da exploração do petróleo por diversas potências coloniais. Nos nossos dias os EUA criaram forças especiais do exército para serem usadas em operações de guerra não convencionais, principalmente fomentando tumultos ou assassinando políticos. Washington implantou secretamente essas forças em 78 países e embora negue a sua existência, o orçamento para as suas missões está a crescer em média 10 mil milhões de dólares por ano para o efeito.
O mesmo se passando com a Arábia Saudita, Turquia e Israel que o fazem em relação aos países vizinhos do continente africano, em particular o Corno de África, diretamente ou com o Conselho de Cooperação do Golfo, integrado por países árabes ricos e onde é a voz mais influente. O ataque terrorista de ontem na Costa de Marfim está seguramente acobertado por esta teia de interesses em criar situações caóticas nestes países, que "justifiquem" uma intervenção militar subsequente.
 
A Síria moderna foi nascendo após a Primeira Guerra Mundial durante o mandato colonial francês. Foi o maior Estado árabe a surgir na região do Levante, que antigamente era dominada pelo Império Otomano. O país conquistou a independência como uma república parlamentar em 24 de outubro de 1945, quando a Síria se tornou membro fundador da Organização das Nações Unidas, um ato que legalmente pôs fim ao antigo domínio francês  embora as tropas francesas não tenham deixado o país até Abril de 1946. O período pós-independência foi tumultuoso, com vários golpes militares e tentativas de golpe, com uma presença permanente dos interesses neocoloniais franceses, que abalaram a nação árabe no período entre 1949 e 1971. Entre 1958 e 1961, a Síria entrou em uma breve união com o Egito, que foi posta de parte depois da revolta militar de 1961. A República Árabe da Síria surgiria no final desse ano depois do referendo de 1 de Dezembro, mantendo sempre alguma instabilidade até ao golpe de Estado de 1963, após o qual o Partido Baath assumiu o  poder.  Bashar al-Assad é o presidente do país desde 2000 e foi precedido por seu pai, Hafez al-Assad, que governou a Síria entre 1970 e 2000, e que foi um dos dirigentes árabes mais carismáticos do século passado. Ambos, face às ambições da vizinhança mantiveram uma sólida relação de aliados
Além do partido Baath estão agrupados na Frente Nacional Progressista (FNP) outros partidos: Movimento Árabe Socialista, União Árabe Socialista, Socialistas Unionistas, Sociais Democratas Unionistas, e duas correntes do Partido Comunista da Síria. Têm ainda existência, o Partido Nacionalista Social da Síria e o Movimento do Voto Nacional.
O regime sírio é uma república semi-presidencial, com um partido dominante, o Baath
O Conselho Popular da Síria é o órgão de poder legislativo da Síria. Este parlamento tem uma só câmara e conta atualmente com 250 membros eleitos para mandatos de 4 anos por representação proporcional em 15 distritos eleitorais.
Nas eleições de 2007, a afluência foi de 56%. A constituição do parlamento ficou composta por 170 dos 250 lugares para a coligação no poder, a FNP, dirigida pelo Partido Baath, o qual ficou com 131 desses 170 lugares. Os restantes 80 lugares vêem de outros partidos e de candidaturas independentes.