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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Os rohingya, Mianmar, a China e o Sudeste Asiático (Parte 1)



As motivações de uma campanha a propósito do “genocídio” dos rohingya

No passado dia25 de Agosto, cerca de 71 pessoas morreram na Birmânia, no sudeste asiático, após um ataque conduzido por 150 homens rohingya . Os rohignya são bengalis, muçulmanos, que no período colonial a Inglaterra deslocou para o estado de Rakhine, na então Birmânia, hoje Mianmar. No ataque, conduzido pelo grupo rebelde, do Exército de Salvação do Rohingya de Arakan, em Rathedaung, no norte do estado de Rakhine, os rebeldes cercaram 30 postos fronteiriços espalhados por 25 localidades. De acordo com a Reuters, entre as vítimas ficaram 59 rebeldes e 12 membros das forças de militares do país. Já em Outubro passado um outro grupo armado com facas e armas de fogo tinha atacado três postos militares perto da fronteira com o Bangladesh. A dura resposta das autoridades do país, em 25 de Agosto, provocou violentos confrontos, que custaram a vida de pelo menos 402 pessoas.


Budistas extremistas reclamam a expulsão dos rihingya

Importa sublinhar o péssimo e intencional comportamento mediático onde se mistura o número de mortos e refugiados desde 25 de Agosto com o ocorrido ao longo de décadas (!) para justificar a tese do genocídio.

Não é a primeira vez que uma etnia da Birmânia (são várias) ou de outros países, com aspirações próprias no quadro dos territórios que os constituem, é usada para a desestabilização interna que altere o quadro político em nome de grandes interesses económicos e geoestratégicos.

Este é o caso do povo rohingya que reside em parte do estado de Rakhine, precisamente onde Mianmar tem no Mar Índico os terminais de petróleo e gás natural, oriundos da China.

Georges Soros há muito que confronta a China (1). Contribuiu para o desenvolvimento de problemas nas suas fronteiras, com vista a enfraquecer este grande país, que tem sido, nos últimos anos um sustentáculo da economia mundial, debilitada pela crise capitalista, e uma esperança para o crescimento e desenvolvimento de muitos países, possível também evitando guerras por outros organizadas, que aproveitam as suas debilidades estruturais. E isso passa por usar os rohingya para desestabilizar Mianmar que tem fronteiras com a China.

Algumas economias globais, imperialistas, já estabelecidas desde há séculos, procuram conter o rápido desenvolvimento económico das nações da ASEAN (2), instigando conflitos internos dentro desse bloco de formações regionais estáveis, para terem uma oportunidade para controlarem estados soberanos e exercerem grande pressão sobre eles.

O objetivo, a médio prazo, é o de, causando-lhes dificuldades de sobrevivência, provocar uma indignação global e inspirar inúmeros "voluntários" muçulmanos (alguns dos quais, sem dúvida, seriam terroristas reais) para inundar o estado de Rakhine e então prepararem o terreno para uma "intervenção humanitária" multilateral, segundo um modelo já testado noutros países, com o objectivo de obter o controlo de um território.

Pensavam liquidar o projecto global “Um cinturão, uma Rota”, versão contemporânea da antiga Rota da Seda, lançada pela China e apoiada e integrada já por muitos países.

 Além disso, outra linha de fractura se daria no quadro do chamado "Choque de Civilizações" (nada mais do que um plano para dividir e governar o hemisfério oriental através da guerra híbrida centrada em diferentes identidades) entre, não só muçulmanos e budistas no Estado de Rakhine, mas possivelmente até eventualmente os budistas e cristãos na parte central de Myanmar e suas periferias do norte-leste, respectivamente. Além disso, poder-se-ia esperar que os "voluntários" budistas e cristãos do exterior também inundassem o campo de batalha, catalisando a própria forma das religiões assumirem o formato do Estado Islâmico.

O actual " Exército de Salvação do Rohingya de Arakan " surge em cena num quadro que o poderia tornar rapidamente no ramo do Estado Islâmico em Mianmar.

Além da remoção geopolítica de Mianmar do mapa do mundo e do sofrimento incalculável de seus mais de 50 milhões de habitantes, a outra vítima seria, naturalmente, a China, que teria que enfrentar uma guerra híbrida parecida com a da Síria ao longo de sua fronteira permeável sul-sudoeste além dos muitos outros desafios de segurança que já se fazem soar na sua periferia (Coreia do Norte, Mar da China Oriental, Mar da China Meridional e Índia). Qualquer plano para um Corredor de Myanmar complementando o Corredor Económico China-Paquistão para o Oceano Índico também seria precipitado, e os agitadores budistas no Tibete também se poderiam radicalizar e nele se inspirar para iniciar um novo ciclo de violência.

A desestabilização de Mianmar pode afectar os projetos de energia da China e criar uma zona de instabilidade à porta de Pequim. Face à confrontação entre os EUA e a Coreia do Norte entre os EUA e a Coreia do Norte, o vizinho chinês pode ficar sob fogos cruzados.

Entretanto, a Task-force da Birmânia, que compreende uma série de organizações financiadas por George Soros, vem operando ativamente em Mianmar desde 2013, convidando a comunidade internacional a parar com o que chamam "o genocídio do grupo minoritário muçulmano Rohingya" (1).

No entanto, a interferência de Soros nos assuntos domésticos de Mianmar já vem de trás. Em 2003, George Soros juntou-se a um grupo da Task Force dos EUA com o objetivo de aumentar a "cooperação dos EUA com outros países para provocar uma transformação política, económica e social, há muito por eles desejada para a Birmânia (Mianmar) ". Na sua visita a Mianmar no final de 2012, Obama iniciou a intervenção directa dos EUA, comportando-se quase como chefe de uma potência ocupante.

Uma nova campanha de informação parcial propagou-se depois de 25 de Agosto nos media à escala universal de um dia para o outro. Tal como aconteceu com o Kosovo e com o genocídio supostamente perpetrado por Milosevic, quando a NATO realizou bombardeamentos em solo europeu, ou com as inventadas atrocidades contra o povo sírio pelo seu presidente Al-Bashar quando a guerra dita “civil” conduzida pela coligação EUA-Inglaterra e França passaram ao ataque com os seus batalhões do Daesh, da Al-Qaeda ou Al-Nusra.

Este conflito começou há cerca de um século e cresceu gradualmente desde 2011, atingindo o seu auge no ano de 2012, quando milhares de famílias muçulmanas procuraram asilo nos campos especiais de refugiados no território do país ou fugiram para o Bangladesh. Em 2016 começou uma nova escalada.

Ao fim de duas semanas de confrontos armados entre o exército birmanês e o grupo rebelde muçulmano, a líder do governo birmanês, prémio Nobel da Paz, e prémio Sakharov, Aung San Suu Kyi quebrou o silêncio para desmentir as acusações de que tem sido alvo, parecendo já não estar nas graças dos seus antigos amigos dos EUA e UE.

A mulher, que durante 15 anos esteve presa pela junta militar que dirigia o país por “defender a democracia”, está agora a ser acusada de esconder as atrocidades que, segundo algumas ONG e as Nações Unidas, estão a ser cometidas no estado de Rakhine, onde vivem milhares de rohingya, minoria étnica muçulmana num país predominantemente budista.

Vários países têm recomendado aos governos de outros países que façam face ao afluxo de refugiados da etnia rohingya e nisso cooperem com o ACNUR, que possui as competências técnicas necessárias para analisar o estatuto de refugiado e dispõe do mandato para proteger os refugiados e os apátridas e têm apelado a esses países a para respeitarem o princípio da não repulsão e a não repelirem os refugiados de etnia rohingya, pelo menos enquanto não tiver sido encontrada uma solução satisfatória e digna para a sua situação, tendo apelado, em particular, ao Bangladesh para que permita a entrada dos refugiados rohingya, reconhecendo paralelamente os esforços já realizados dos pelas autoridades daquele país para acolher várias centenas de milhares de refugiados.
 

O petróleo e o gás natural descobertos, em 2004, no offshore de Mianmar

O conflito com cerca de um século é usado por actores externos para prejudicar a estabilidade do sudeste asiático, especialmente devido ao facto de que o que está em jogo serem vastas reservas de hidrocarbonetos localizadas no offshore do estado de Rakhine, onde residem os rohingya.

O estado de Rakhine na rota dos pipelines de gás e petróleo
e da ligação de Miamar ao mar (na planta o nome inglês da antiga Birmânia) 
A zona costeira de Arakan (Rakhine) quase certamente conterá hidrocarbonetos de petróleo com excelente viabilidade de exploração. Há um enorme campo de gás chamado Than Shwe, nome do general do Partido do Programa Socialista para a Birmânia, que presidiu ao Conselho de Estado para a Paz e o Desenvolvimento entre 1992 e 2011.

Depois da descoberta das enormes reservas de energia de Rakhine em 2004, isso atraiu a atenção da China. Até 2013, a China completou oleodutos de petróleo e de gás natural, que ligam o porto de Kyaukphyu, de Myanmar, com a cidade chinesa de Kunming, na província de Yunan.

O oleoduto permite que Pequim faça chegar o crude ao Médio Oriente e Africa, fazendo um bypass no Estreito de Malaca, enquanto o gasoduto transporta hidrocarbonetos dos campos offshore de Myanmar para a China.

O desenvolvimento do projeto de energia China-Myanmar coincidiu com a intensificação do conflito comos rohingya em 2011-2012, quando 120 mil requerentes de asilo deixaram o país para escapar ao derramamento de sangue.
Os pipelines que ligam a China a Mianmar e à Baía de Bengal
 
Os rohingya

A presença desta etnia na Birmânia (hoje Mianmar) tem origem na migração do subcontinente indiano para Mianmar. Ela ocorre há séculos, em parte associada à disseminação do budismo, hinduísmo e islamismo na região. A região histórica de Bengala (agora Bangladesh) e o estado indiano de Bengala Ocidental têm ligações históricas e culturais com o Estado Rakhine (anteriormente Arakan) de Mianmar, estado que liga o país ao Mar Índico, assumindo grande importância comercial e estratégica.

Mas essa migração foi forçada pela potência colonial – a Inglaterra – que levou ao forçar de uma enorme presença de muçulmanos no estrado de Rakhine.

Os conflitos anuais têm-se repetido ciclicamente ao longo de décadas de tensões budistas-muçulmanas nessas áreas da fronteira birmanesa.

Os massacres de Arakan, em 1942, no decurso da Segunda Guerra Mundial entre recrutas da V Força Rohingya e os Rakhines pró-japoneses, polarizaram os problemas étnicos na região, que tem um mosaico de diferentes etnias, que não existe noutros países da região.

No período colonial britânico, em 1936 e 1939, vários indianos arakaneses, como Gani Markan, foram eleitos para o Conselho Legislativo da Birmânia como nativos da Birmânia britânica. Após a independência da Birmânia, em 1948, os líderes de Rohingya ocuparam altos cargos no governo e no parlamento birmanês. Em 1948, A. Gaffar defendeu o reconhecimento oficial dos Rohingya como um dos grupos étnicos da Birmânia. Uma das duas primeiras mulheres legisladoras da Birmânia, Zura Begum, foi eleita pelos rohingya em 1951.

Durante a 2ª Guerra Mundial, os ingleses, estacionados na Índia, formaram milícias anti japonesas constituídas por bengalis muçulmanos mas alguns soldados britânicos foram forçados a admitir que estes corpos, às vezes, preferiam atacar os aldeões budistas em vez de combaterem os japoneses...Os ingleses não se preocuparam em organizar relações intercomunitárias após o fim do conflito e as raízes do conflito permaneceram. Segundo o “Le Monde” (3) os grupos combatentes rohingya chegaram a conflituar entre si e, enfraquecidos pelas rivalidades internas, nunca conseguiram reunir mais de uma centena de combatentes. Usaram o Bangladesh como rectaguarda de apoio. A Associação de Solidariedade Rohingya, saída dos movimentos islâmicos do Bangladesh, foi uma das mais ativas. Segundo o jornal, o actual Exército de Salvação do Rohingya de Arakan, permanece uma força um tanto nebulosa. Alguns dizem que é teleguiado pelos Rohingya exilados na Arábia Saudita e no Paquistão, mas os seus porta-vozes asseguraram recentemente que a sua luta é desprovida de motivações jihadistas. Há que se estar atento ao que trarão no bojo, digo eu.

Relativamente aos grupos étnicos, logo após a independência, em 1948, parte deles movimentaram-se no sentido de uma maior autonomia face ao estado birmanês, o que conduziu à guerra civil.

 

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